José Sócrates apresenta livro no Brasil sobre os “sombrios anos de Bolsonaro”

No lançamento de uma seleção de crónicas escritas na revista Carta Capital, o antigo primeiro-ministro fez rir a plateia com história envolvendo Augusto Santos Silva

Artigo escrito pelo jornalista João Almeida Moreira e publicado pelo jornal português Diário de Notícias, no dia 10 de agosto de 2023. Confira aqui.

José Sócrates apresentou, na noite de terça-feira, 8 de agosto, na Casa de Portugal, em São Paulo, o seu último livro, “Os Anos Bolsonaro, Crónicas de Tempos Sombrios”, uma seleção de textos publicados na revista brasileira Carta Capital ao longo dos quatro anos de governo do antecessor de Lula da Silva.

Para uma plateia composta sobretudo por académicos e advogados, Sócrates e Reinaldo Azevedo, colunista do jornal Folha de S. Paulo, entre outros meios de comunicação social do Brasil, convidado para a apresentação, sublinharam os riscos que o estado democrático de direito correu sob a presidência de Bolsonaro e sob os efeitos da Operação Lava Jato, conduzida por Sergio Moro, que, em 2018, de juiz passou a ministro da Justiça.

Após a leitura de um trecho de uma das crónicas do livro, a propósito do lançamento (depois frustrado) de Sergio Moro à presidência da República do Brasil em novembro de 2021 – “tudo ali é pobre, triste e medíocre”, escreveu o antigo primeiro-ministro sobre o antigo juiz da Lava Jato -, Sócrates não resistiu a abordar a política portuguesa, referindo-se, sem o nomear, a Augusto Santos Silva, hoje presidente da Assembleia da República,

“Vou contar uma história”, avisou. “Em 2019, o ministro da Justiça do Brasil [Sergio Moro] fez uma palestra, num evento chamado Conferências do Estoril, ao lado da ministra da Justiça de Portugal [Francisca Van Dunem], entretanto, não sei por que razão, estava lá o então ministro dos Negócios Estrangeiros [Augusto Santos Silva] na primeira fila, a aplaudi-lo, ele é a mesma pessoa que agora, no último 25 de abril, enquanto presidente da Assembleia da República, aplaudiu Lula e mandou calar a extrema-direita portuguesa…”, disse, provocando risos.

No lançamento de “Os Anos Bolsonaro, Crónicas de Tempos Sombrios”, livro editado pela Contracorrente, Sócrates explicou que a obra “é uma seleção de 20 crónicas escritas ao longo de quatro anos na Carta Capital, a primeira logo após as eleições de 2018 e a última, depois das de 2022”. “E, no fundo, é um capricho porque é uma reflexão sobre um período histórico que queria partilhar com os meus amigos brasileiros”.

Segundo Sócrates, “as crónicas são textos de análise mas também de ação, de quem queria intervir porque aquilo que o Brasil passou nestes quatro anos não foi só um problema dos brasileiros – foi um problema do mundo”.

“Mas um político é um profissional do otimismo”, sublinhou, a propósito da primeira das crónicas, sobre a noite das eleições de 2018, em que Bolsonaro bateu Haddad, sob o título “Só Temos Olhos Para os Vencidos”. “São eles, os derrotados, que representam o Brasil que conheço e que admiro, feito de inclusão social, de alargamento de oportunidades, de compromisso, de moderação política e de ambição democrática”

No texto, o antigo primeiro-ministro nota que a razão dominante para a vitória de Bolsonaro foi o regresso da “explicação de classe, que a governação inclusiva e moderada de Lula procurou ultrapassar”. Com uma particularidade brasileira: “Não é o ressentimento do povo com os de cima, os abastados; mas o contrário, é o ódio dos de cima aos de baixo, aos pobres”

Reinaldo Azevedo disse que o que mais lhe tocou no livro foi “a mensagem de esperança”. “No livro do Sócrates, além de ele escrever maravilhosamente bem, o que me dá uma certa inveja, o que quero destacar é que ele viu esperança, onde nós, aqui, não víamos”. “Mesmo crítico da esquerda, desde 2014 que denunciava a Lava Jato por sentir que desestruturaria a democracia e, na verdade, acabou mesmo por preparar caminhos aos tempos sombrios do governo de Jair Bolsonaro”, continuou Azevedo.

O jornalista, depois, leu trecho de uma crónica de Sócrates sobre um telefonema de condolências de Gilmar Mendes, juiz do Supremo Tribunal Federal, a Lula da Silva, por ocasião do enterro do neto deste, Arthur, de sete anos, mesmo depois do jurista e do político, na época detido em Curitiba, terem tido fortes embates públicos. “O choro de Gilmar e de Lula é pela democracia. Mas é também um choro que nos lembra que ela existe”

Na mesa, além do advogado Rafael Valim, da editora Contracorrente, estava o anfitrião Renato Afonso Gonçalves, presidente em exercício da Casa de Portugal, um edifício exuberante e histórico no bairro da Liberdade, no centro de São Paulo. “Fundada em 1935, a Casa de Portugal é uma instituição, sobretudo cultural, independente dos estados brasileiro e português”, notou Gonçalves, advogado com escritórios na megalópole brasileira e na capital portuguesa, Lisboa.

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