Livro reúne interpretações do Brasil a partir da visão feminina

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Obra com lançamento nesta terça (1º) apresenta contribuições de 45 mulheres, de Carolina Maria de Jesus a Mãe Menininha do Gantois

Artigo escrito pelo jornalista Gabriel Araújo e publicado pelo jornal Folha de São Paulo, no dia 28 de julho de 2023. Confira aqui.

Em 2014, os historiadores Lincoln Secco e Luiz Bernardo Pericás, ambos ligados ao departamento de história da USP, publicaram o livro “Intérpretes do Brasil: Clássicos, Rebeldes e Renegados” (ed. Boitempo), com o intuito de apresentar um panorama do pensamento crítico político e social brasileiro dos séculos 20 e 21.

Passado o lançamento, Secco se sentiu incomodado ao notar que todos os intelectuais escolhidos para compor a obra eram homens. “Percebemos que a história desses intérpretes é, em geral, masculina porque nós só privilegiávamos uma forma de interpretação, a do ensaio, da tese acadêmica, enfim, da escrita para as classes dominantes de um país como o Brasil, com escassa alfabetização.”

Desse incômodo, nasceu o desejo de uma publicação que reunisse contribuições das mulheres para pensar o país. O resultado é o livro “Mulheres que Interpretam o Brasil” (ed. Contracorrente), organizado por Secco em parceria com os professores e pesquisadores Olga Brites e Marcos Silva.

A ialorixá Mãe Menininha do Gantois, cuja história é apresentada no livro “Mulheres que Interpretam o Brasil”, em foto da década de 1970 – Acervo UH/Folhapress

A obra será lançada nesta terça-feira (dia 1º), em São Paulo. Além de dois dos organizadores, Secco e Brites, o evento terá a participação de quatro dos autores: Graziela Forte, Helena Wakim Moreno, Luiz Bernardo Pericás e Patrícia Valim.

O livro, que reúne ensaios e artigos de diversas pesquisadoras e pesquisadores das ciências humanas, promove não apenas um novo olhar em relação ao gênero das personagens históricas. Também privilegia uma descentralização geográfica –ou seja, vai muito além do Sudeste– e tipos de interpretação que transcendem o campo acadêmico.

Ao destacar 45 mulheres cujas trajetórias têm impactado a história do Brasil, a obra traz à tona leituras de país feitas no campo das artes, da cultura, da atividade política e da religiosidade.

Na seleção, estão nomes consagrados, como o a escritora Carolina Maria de Jesus, autora de “Quarto de Despejo” (1960), livro escolhido pelo projeto 200 anos, 200 livros como a obra mais importante para entender o Brasil, e figuras menos conhecidas, como a poeta Laura Brandão, uma das primeiras militantes comunistas no país.

Conheça as mulheres lembradas no projeto Mátria Brasil

“Mais do que um livro para ser lido de cabo a rabo, de uma vez só, esta é uma obra de consulta permanente. As pessoas podem consultá-la para fazer outros trabalhos que deem o relevo merecido a essas mulheres”, diz Secco.

Convidada para participar da coletânea, Patrícia Valim, professora do departamento de história da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e idealizadora do projeto Mátria Brasil, escreveu sobre Mãe Menininha do Gantois, ialorixá de Salvador.

Segundo a historiadora, Mãe Menininha foi uma das principais responsáveis pela descriminalização do candomblé na Bahia, em 1976. A importância dela para o estado e para o Brasil como um todo se deu, entre outros fatores, a partir das alianças estratégicas que a mãe de santo teceu a partir de sua posição. Tal feito não se deu sem algumas controvérsias, como o texto mostra.

“Qual era a estratégia?”, diz Valim. “Abrir a casa de candomblé não só para os iniciados, mas também para alguns homens brancos e poderosos da localidade no início do século 20”. Assim, o terreiro do Gantois passou a ser frequentado por delegados de polícia e por diversos intelectuais e artistas, como Jorge Amado, Caetano Veloso e Maria Bethânia.

Apesar de não ter deixado escritos em vida, Mãe Menininha legou diversas contribuições que compõem a cultura imaterial das religiões afro-brasileiras, além de ter gravado discos e concedido entrevistas que a revelam como uma articuladora política.

O Brasil que a ialorixá interpreta é, de acordo com Valim, “sincrético, conciliador e democrático, onde todas as religiões conviviam, com embates, mas sem uma perseguir a outra.” E acrescenta: “Mãe Menininha é a grande responsável por desmistificar a religião afro”.

Sobre o evento de lançamento:

📍Data, horário e local:
Terça-feira, 01/08, às 19h
Livraria da Vila – Lorena
(Alameda Lorena, 1501 – Jardim Paulista, SP)

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